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100 anos de arte

No acervo do Estado do Rio Grande do Norte

Por Antônio Marques

NAVARRO, Newton

A maioria dos norte-rio-grandenses desconhece o acervo da Pinacoteca do Estado que guarda um tesouro precioso de obras de arte. Esse rico acervo artístico está sendo atualmente apresentado ao público, no primeiro andar, da Pinacoteca, em uma exposição de longa duração.

Objetivando conhecer melhor essa história, traçamos um roteiro, didático e conceitual, que pode facilitar a compreensão do que aconteceu no RN em relação às artes plásticas, nestes últimos 100 anos.

Para facilitar o nosso percurso vamos agrupar toda amostra em blocos temáticos, conferido uma identificação para cada sala e descrevendo cada uma delas usando uma conceituação tecnicamente apropriada.

Sala 1A – Talha em Madeira
Na escadaria monumental, que dá acesso ao primeiro andar, nos deparamos com paredes cobertas por blocos de madeira artisticamente entalhados. Entre nós o período áureo da talha aconteceu durante as décadas de 1960 a 1980.

Melhores representantes desse movimento: Manxa, (Ziltamir Sebastião Soares de Maria) e seu discípulo, Jordão (José de Arimatéia). Não podemos deixar de mencionar o artista Taciano Arruda, parceiro de Newton Navarro em algumas obras. O Crucifixo aqui presente é da lavra de sua oficina.

Os grandes painéis foram entalhados por Manxa e recolhidos pela Fundação José Augusto nas agências do Banco Estadual do Rio Grande do Norte – BANDERN, no começo da década de 90.

Sala 2B – Academicismo
O Academicismo, vindo da Europa, dominou as artes plásticas do Rio Grande do Norte até os meados do Século XX. No Brasil o grande difusor desse Movimento foi a Academia Imperial de Belas Artes, criada por D. Pedro II sob o comando da Missão Artística Francesa.

A arte ensinada na Academia de Belas-Artes orientava-se pelos padrões estéticos clássicos, renascentistas ou neoclássicos.

Os quadros expostos nesta sala foram produzidas pelos seguintes artistas:
Antônio Diogo da Silva Parreiras (1870 – 1937), RJ. O Julgamento de Frei Miguelinho, Paris, 1918 - trabalho encomendado pelo Governo do Estado para comemorar a Revolução Pernambucana de 1817.

Manuel de Moura Rabello (1875 – 1979), RN. Participa desta sala com três telas abordando temas variados, mas todos inseridos no classicismo. Inúmeros de seus familiares sempre estiveram ligados as artes em nosso Estado, inclusive o escritor e artista Dorian Gray.

Francisco Peixoto Sá (1848 – 1904), Pintor Maranhense que viveu no Rio de Janeiro, tendo pintado em 1902 o retrato de Alberto Maranhão, por quem nutria grande admiração.

Hostílio Dantas (1894 – 1975), RN. Na ilustração das obras clássicas, nesta sala, é o único escultor representado por duas obras: uma cabeça em terracota e a outra em gesso. Natural de São José de Mipibu-RN, mas viveu no Rio de Janeiro grande parte de sua vida.

Vicente Murillo La Greca (1897 – 1985), Pintor natural de Pernambuco onde sempre contou com o reconhecimento do seu talento de pintor clássico. A obra aqui exposta representa, indiscutivelmente, uma transição para a modernidade.

Nesta sala, finalmente, ainda encontra-se um mobiliário do começo do Século XX, em estilo eclético, inspirado no colonial brasileiro.

Sala 3C - Vestígios do Academicismo
Destaque para o quadro de Raymilson de Moura Rabelo, que pintou em estilo acadêmico, em 1995. Sem duvida um mergulho atemporal no classicismo. O mesmo acontece com o pintor José Caldas Lira (RN).

A iconografia da Fortaleza dos Reis Magos é um trabalho impresso sem data e que tem por modelo a gravura de Arnoudus Montanus, Fluvius Grandis, Amsterdam, 1671. Esta gravura foi a mais divulgada de todas as releituras feitas a partir da pintura de Frans Post, que é responsável pelo primeiro registro iconográfico de um tema relacionado com o RN.

Sala 4D - Sala dos Governadores
O sofá e as cadeiras desta sala formam um conjunto do mobiliário do século XIX. Estilo Beranger.

A estante e o birô, confeccionados em tons mais escuros correspondem ao estilo “Torneado Português” do começo do século XX.

O busto de D. Pedro II e o medalhão do Almirante Tamandaré são peças confeccionadas em bronze, por artistas ainda não identificados.

O relógio do começo do século XX é de fabricação “Ansonia”.

As duas paredes em ângulo reto apresentam retratos dos ex-governadores do Rio Grande do Norte.

Sala 5E - Modernismo no RN
Em Natal, a repercussão do Movimento Modernista de 1922 deu-se, primeiro, no campo literário, e só conseguiu se implantar, definitivamente, nas artes plásticas, em 1949, graças à sensibilidade e inteligência de Newton Navarro.

Efetivamente, foi ele que realizou uma exposição, aberta em dezembro de 1948 até janeiro de 1949 que ficou conhecida como o I Salão de Arte Moderna do Estado.

Em 1950, dois artistas idealistas, Dorian Gray e Ivon Rodrigues se aliaram às propostas estéticas do Movimento Modernista e juntos promoveram o II Salão de Arte Moderna do Estado.

O referido salão que foi de fato a primeira coletiva de Arte Moderna do Estado, contou com o apoio de inúmeros intelectuais, entre os quais Luís da Câmara Cascudo, Zila Mamede, Américo de Oliveira e Veríssimo de Melo.

Com a realização deste evento, de caráter coletivo, e aglutinador, implantou-se, finalmente, no Estado, as propostas do Movimento Modernista.

Nesta sala trabalhos de Newton Navarro e Dorian Gray ilustram a chegada do Movimento Modernista no RN.

Sala 6F - Desdobramentos do Modernismo
A década de 1950 vai permanecer sob a influência da II Coletiva de Arte Moderna, realizada em Natal – RN.

Newton Navarro e Dorian Gray permaneceram atuantes nos movimentos artísticos da cidade. Foram eles que participaram da comissão julgadora do salão organizado pela Aliança Francesa, em 1957, denominada “Jogos Olímpicos de Verão”.

Saíram vencedores do certame: em primeiro lugar Thomé Filgueira, e em segundo, Túlio Fernandes, ambos adeptos da nova arte. Thomé reinventava o impressionismo nos trópicos, enquanto Túlio defendia cores quentes e formas rigorosamente estilizadas.

Na década de 1960 o mesmo entusiasmo pela renovação estética. Após inúmeras exposições que consolidaram o Movimento Modernista nas artes plásticas, novas experiências foram apresentadas. Surgem, então, os jovens modernistas da segunda hora: Leopoldo Nelson, Jussier Ribeiro e Zaíra Caldas. Os dois primeiros aqui citados inserem-se no Movimento Expressionista. No trabalho de Jussier Ribeiro prevalece uma aura de romantismo sombrio. Zaíra segue um caminho que, mais tarde, foi denominado por ela mesma de Transfigurativismo.

Sala 7G – Arte Cinética – Optical Arte – Abstracionismo
“Cinética” é um ramo da física deslocado por artistas de vanguarda para o terreno das artes plásticas, em meados do século XX. Assim surge a Arte Cinética, vertente que rompe com o caráter estático da produção artística daquele momento.

Não é por acaso que a primeira exposição deste gênero de arte denominava-se “Le mouvement” que aconteceu em Paris em 1955.

No Brasil a Arte Cinética teve início quando Abraham Palatnik expos na I Bienal de São Paulo, em 1951, o aparelho cinecromático.

No acervo da Pinacoteca, os quadros de Palatnik criam ilusões ópticas, inusitadas, mas não se trata de obras em movimento real. O movimento advém de uma percepção do observador.

Os trabalhos aqui expostos se aproximam da optical arte, termo usado para aglutinar artistas que pesquisam as ilusões ópticas.

Nesta sala não podemos deixar de mencionar as experiências estéticas de Ruth Aklander Palatnik, Jota Medeiros, Di Souza, Lutthermila, Mehlinscky e Ermínio Souza.

No trabalho de Raul Córdula, há uma nítida influência do abstracionismo geométrico.

Sala 8H – Arte Popular – Primitiva – Naif
Trata-se de uma vertente universal da arte. No Brasil passou a ser valorizada após o Movimento Modernista de 1922, que divulgou entre suas tendências o gosto por tudo o que era genuinamente nacional e popular.

Registre-se a grande fecundidade da arte popular em nosso Estado, cuja origem vai do período colonial, passando pela arte de Maria do Santíssimo, os irmãos Iaponi e Iaperi Araújo, Aécio Emereciano, Carlos José, Francisquinha Cruz, Nivaldo Rocha, Fé Córdula até a chegada de artistas como Edilson Araújo, Vatenor, Lourdinete, Rosa M, Ivanise, Etelânio, revelam o potencial artístico do nosso Estado.

Ainda nesta sala merecem destaque nomes de prestigio internacional: Antônio Maia e Silvia Charel.

Sala 9I - Estética da Continuidade e da Ruptura
As obras de arte aqui expostas abrangem um longo período: últimos decênios do século XX até o inicio do século XXI. Estamos diante de uma produção artística heterogênea, quanto ao estilo e quanto à técnica.

Trata-se de obras inscritas em um processo de continuidade e renovação do Movimento Modernista, como podemos observar nas trabalhos de: Rossini Perez, Fernando Gurgel, Erasmo Andrade, Marcelus Bob, Dione Caldas, Marlene Galvão, Madê Wainer, Cristina Jacomé, Assis Marinho e outros. Diversos artistas, no entanto, apontam para uma estética da ruptura seguindo propostas da Pós-Modernidade. É o que acontece com as esculturas de Guaraci Gabriel, Fábio Di Ojuara, Felipe Bezerra e Ana Antunes.

Em relação à pintura insere-se nessa nova vertente os trabalhos de Vicente Vitoriano, Clarissa Torres, Flávio Freitas, Hanna Lauria e Eduardo Alexandre – todos do RN.

Os quadros expostos nesta sala revelam também que o acervo da Pinacoteca foi ampliado com doações/aquisições de artistas originários de outros estados do Brasil e até mesmo do exterior. Merecem destaque as obras de: Gil Vicente (PE), Edson Helenus (PE), Calasans Neto (BA), os internacionais Marek Richard (DE) e H. R. Giger (SWZ) – designer que criou o design do personagem Xenomorfo, da famosa serie dos filmes Alien.

A dinâmica do crescimento do acervo da Pinacoteca nos últimos 100 anos é inquestionável. No entanto, é preciso atualiza-lo com a aquisição da obra dos novos artistas que estão despontando no horizonte das artes visuais.

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