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A cada sete minutos uma nova agressão

O Rio Grande do Norte é o quinto Estado com maior número de casos de violência doméstica. E é nesse âmbito que atua a Secretaria Extraordiná­ria de Políticas Públicas para as Mulheres.

Por Marília Rocha

George Schall

Gritos. Choro. Desgraça. Era assim que o mundo de Maria Cristina se desenhava toda sexta-feira. O pânico batia a sua porta no mesmo momento em que o companheiro, o João também chegava. O bater na porta parecia indicar mais uma noite de transtorno para a dona de casa.Machismo. Alcoolismo. Agressão.

Aos 45 anos, Maria Cristina não acreditava mais em amor, respeito e compreensão. Ela era, antes de qualquer outra definição subjetiva, uma mulher forte. Era ela que financiava o pouco de conforto de sua casa. E ela era que mais sofria, mais apanhava. Menina criada no interior, Maria Cristina era uma mulher cheia de sonhos, até sofrer as primeiras agressões. Em uma delas, foi hospitalizada e por vergonha dos vizinhos, apontou a causa para o espancamento como um assalto.

Os dados apontam que no Brasil, a cada sete minutos , uma nova denúncia de violência contra mulher é feita. Violência física, sexual e verbal. Na lista dos agressores estão, em sua maioria, os seus companheiros. Mais novos, mais velhos, mais fortes. Mais selvagens.

O Rio Grande do Norte é o quinto estado do país com maior número de casos de violência doméstica, principalmente nos municípios de Natal, Mossoró e Parnamirim. O Estado que registra o maior número de vítimas no Brasil é o Espírito Santo. De acordo com dados do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte (TJRN), o Rio Grande do Norte tem mais 15 mil processos judiciais relacionados à crimes contra a mulher.

As denúncias contra agressores são feitas através da Lei Maria da Penha (nº 11.340/2006), que pune agressores e protege as mulheres através de processos criminais. A lei inclui brigas entre companheiros homem e mulher, e também casais homossexuais, transmulher (transgênero que são identificadas por gênero feminino) e agressões por parentes, como pai, tio, avô ou irmão.

Ao denunciar, as mulheres buscam medidas protetivas que podem ser o afastamento do agressor do lar ou local de convivência com a vítima, a fixação de limite mínimo de distância de que o agressor fica proibido de ultrapassar em relação à vítima e a suspensão da posse ou restrição do porte de armas, se for o caso. O agressor também pode ser proibido de entrar em contato com a vítima, seus familiares e testemunhas por qualquer meio ou, ainda, deverá obedecer à restrição ou suspensão de visitas aos dependentes menores, ouvida a equipe de atendimento multidisciplinar ou serviço militar. Outra medida que pode ser aplicada pelo juiz em proteção à mulher vítima de violência é a obrigação de o agressor pagar pensão alimentícia provisional ou alimentos provisórios.

A Maria da Penha também restringe a movimentação dos bens da vítima também podem ser protegidos por meio das medidas protetivas. Essa proteção se dá por meio de ações como bloqueio de contas, indisposição de bens, restituição de bens indevidamente subtraídos pelo agressor e prestação de caução provisória, mediante depósito judicial, por perdas e danos materiais decorrentes da prática de violência doméstica.

De acordo com o ordenamento jurídico, o juiz pode determinar uma ou mais medidas em cada caso, podendo ser substituídas a qualquer tempo por outras de maior eficácia, sempre que os direitos reconhecidos pela Lei Maria da Penha forem violados. A lei também permite que, a depender da gravidade, o juiz possa aplicar outras medidas protetivas consideradas de urgência. Entre elas, está o encaminhamento da vítima e seus dependentes para programa oficial ou comunitário de proteção ou de atendimento, determinar a recondução da vítima e de seus dependentes ao domicílio, após o afastamento do agressor e determinar o afastamento da vítima do lar, sem prejuízo dos direitos relativos a bens, guarda dos filhos e recebimento de pensão. Sempre que considerar necessário, o juiz pode requisitar, a qualquer momento, o auxílio da força policial para garantir a execução das medidas protetivas.

Outro avanço no combate a violência contra a mulher foi dado em março de 2015 quando foi sancionada a lei 13.104/2015, a Lei do Feminicídio, classificando-o como crime hediondo e com agravantes quando acontece em situações específicas de vulnerabilidade (gravidez, menor de idade, na presença de filhos e situações correlacionadas).

Voltando para Maria Cristina. Mais do que um exemplo, as agressões que ela sofre podem ser enquadradas nos chamados “crimes passionais” que tem geralmente como motivação o ciúme e uso de álcool e outras drogas. “A violência contra a mulher possui fases que compõem um ciclo que pode se tornar vicioso, repetindo-se ao longo de meses ou anos. É comum que esse ciclo se repita, com maior violência e menor intervalo entre as fases”, destaca a psicóloga Marianne Araújo, que detalha ainda que a maioria das agressões acontece dentro das residências das vítimas e tem início com ameaças e agressões verbais, como uma forma de “instrumento de resolução de conflitos”.

Outro dado importante é que as agressões ocorrem em todas as idades e classes sociais: “Aspectos financeiros, culturais e sociais podem desencadear a violência contra a mulher, com graves repercussões. Em muitos casos, o companheiro está desempregado e sem perspectiva de retorno ao mercado de trabalho, aumentando as estatísticas de violência contra a mulher. Sob o domínio do medo, muitas mulheres não denunciam”, argumenta a psicóloga.

Grupos no Rio Grande do Norte militam no trabalho preventivo, de conscientização em busca da mudança de cultura em relação às mulheres. Além da conscientização entre as mulheres – na busca pelas denuncias oficiais – o trabalho com o agressor também é feito com a finalidade de que não realize a mesma prática contra outras mulheres.

Em termos nacionais, no Brasil, a população feminina ultrapassou 103 milhões de mulheres em 2014. Uma em cada cinco considera já ter sofrido alguma vez “algum tipo de violência de parte de algum homem, conhecido ou desconhecido” (Fundação Perseu Abramo, 2010).

Em relação ao mundo, de acordo com a mais recente publicação do Mapa da Violência, o Brasil tem taxa de 4,8 homicídios por 100 mil mulheres. Em relação ao contexto internacional, o Brasil, num grupo de 83 países com dados da Organização Mundial da Saúde, ocupa uma pouco recomendável 5ª posição, evidenciando que os índices locais excedem, em muito, os encontrados na maior parte dos países do mundo. Efetivamente, só El Salvador, Colômbia, Guatemala (três países latino-americanos) e a Federação Russa evidenciam taxas superiores às do Brasil. Mas as taxas do Brasil são muito superiores às de vários países tidos como civilizados.

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